Audiência pública cobra melhores meios de participação da sociedade e dos trabalhadores no Sistema Socioeducativo do Paraná

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Cerca de 100 pessoas participaram da audiência pública “O Sistema Socioeducativo do Paraná em foco”, realizada no plenarinho da Assembleia Legislativa na manhã dessa terça-feira (10)

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Foto: Pedro de Oliveira/ Alep

O plenarinho da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) ficou lotado, na manhã dessa terça-feira (10), durante a Audiência Pública “O Sistema Socioeducativo do Paraná em Foco”, promovida pelo movimento Paraná Contra a Redução da Maioridade Penal, pela Comissão de Direitos Humanos e da Cidadania da Alep e pelo Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA/PR). A mesa de debates contou com a presença de representantes do Ministério Público do Paraná (MP-PR), da Defensoria Pública do Paraná, da Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (Seju), do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), da Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedca-PR), do Sindicato dos Servidores da Socioeducação do Paraná (Sindsec), da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR) e dos deputados estaduais Tadeu Veneri, Chico Brasileiro e Professor Lemos.

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Foto: Pedro de Oliveira/ Alep

A representante do Conselho Nacional dos Direitos da Criança do Adolescente (Conanda), Jimena Grignani, iniciou a rodada de falas ressaltando que o Conanda foi o principal responsável pela elaboração da Lei 15.594/2012, que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), texto que prevê não só as diretrizes da aplicação das medidas socioeducativas, mas também o próprio monitoramento dessa implementação. Jimena aponta que o Conselho ainda aguarda a construção dos planos estaduais de socioeducação, mas que o objetivo deve ser maior que esse. “Nós temos que, além de ter investimentos periódicos e sistemáticos, ter um combate à cultura punitiva e tornar realidade o aspecto socioeducativo”, apontou.

O Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedca-PR) foi representado pelo conselheiro governamental Leandro Meller, que citou a aprovação do Plano Estadual de Socioeducação do Paraná dentro do prazo estabelecido pela lei e o desafio de monitorar as determinação do plano, dificuldade que, segundo Leandro, se deve ao fato de o Paraná ter 322 municípios de pequeno porte sem política de assistência social de média complexidade bem estruturada. Além disso, Leandro reforçou a importância de o debate girar, também, em torno da prevenção aos atos infracionais. “A medida socioeducativa é necessária, deve ser aplicada, mas nós também temos que pensar na prevenção, para que não seja necessários certos encaminhamentos, já que o nosso foco é o adolescente como prioridade absoluta”, frisou.

Já o presidente do Sindicato dos Servidores da Socioeducação do Paraná (Sindsec-PR), Dirceu de Paula Soares, enfatizou que o mais importante é consolidar a Lei do Sinase. De acordo com o presidente, o sistema de socioeducação do Paraná, que já foi considerado um dos menos piores do Brasi,l é, hoje, um dos piores do país. “Precisamos rever também a superlotação do sistema de socioeducação do Paraná, mas não só a superlotação em relação à estrutura, mas também a referente ao número de adolescentes”, propôs. Dirceu também citou a urgência da criação de um Centro de Socioeducação para meninas no interior do estado, já que o único disponível atualmente fica em Curitiba.

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Foto: Pedro de Oliveira/ Alep

Para a sociedade, quem é gente e quem é sub-gente?

Thelma Alves de Oliveira é ex-coordenadora geral do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) e discursou sobre os fatores que contribuem para a visão retrógrada que impera na sociedade atualmente. “Para a sociedade, quem tem dinheiro e acesso a bens é pessoa de bem e quem não tem acesso a bens são pessoas do mal. Isso estabelece duas categorias: a dos humanos e a dos sub-humanos. Enquanto a gente não superar essa visão, não conseguiremos implantar o sistema socioeducativo”, critica.

A ex-coordenadora prevê, também, perdas de direitos e retrocessos em todos os aspectos para os próximos anos. “A crise econômica, que é mundial, sem dúvida vai aprofundar as desigualdades sociais. A crise política vai promover retrocesssos aos direitos já conquistados, está fazendo diariamente. E o Estado responde a tudo isso com ajuste fiscal e mais cortes em programas sociais. Quem vai se prejudicar com isso? As famílias dos meninos pobres”, enfatiza. Para Thelma, a repercussão desse cenário no Sinase é o aprofundamento da criminalização da pobreza, o reforço da visão punitiva, menos dinheiro, menos qualidade de trabalho e, consequentemente, piores indicadores e menos inserção social.

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Foto: Pedro de Oliveira/ Alep

Outras deficiências do sistema socioeducativo do Paraná foram citadas pela promotora de justiça do Ministério Público do Paraná na área de adolescentes em conflito com a lei, Danielle Cristine Cavali Tuoto. Primeiramente, Danielle explicou que existem “dois mundos”: o sistema aberto (de competência dos municípios) e o fechado (responsabilidade do estado). A promotora criticou a estrutura física e a quantidade de profissionais de que dispõe a socioeducação do Paraná.Também mencionou a dificuldade da promoção do fortalecimento de vínculos para as meninas de todo o estado que se encontram no único Centro de Socioeducação (Cense) feminino do estado, localizado em Curitiba.

No final da fala, Danielle questionou a falta de vontade de se criarem melhores condições de funcionamento para o sistema de socioeducação do Paraná. “A velocidade com que a crescem a desiguldade social nesse país e o número de atos infracionais cometidos por adolescentes não é a mesma que o poder público consegue dar conta. Nunca vai ser, até porque o processo de licitação é lento e dura anos. Mas simples é começar. Simples é querer começar”, enfatiza.

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Foto: Pedro de Oliveira/ Alep

A defensora pública do Paraná, Lívia Martins Salomão Brodbeck, compareceu à audiência pública representando o Grupo de Trabalho da Infância e da Juventude da Defensoria Pública do Paraná. Lívia reforçou o compromisso do órgão com os e as adolescentes em conflito com a lei e mencionou que, apesar das dificuldades orçamentárias, todas as comarcas da entidade dão prioridade absoluta à criança e ao adolescente. “Desde que entramos, estamos encarando esse desafio que é ainda maior com o conservadorismo que nós temos identificado hoje em dia. Estamos lutando contra a redução da maioridade penal e contra todas as propostas que querem endurecer ainda mais o sistema socioeducativo, incluindo as que propõem o aumento do tempo de internação”, disse a defensora, que citou o Sistema de Justiça como co-responsável pelos problemas do sistema socioeducativo e afirmou identificar que o recrudescimento do Congresso Nacional está refletido no Poder Judiciário.

Prioridades não prioritárias

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Foto: Pedro de Oliveira/ Alep

Após apresentar os dados e as precariedades encontradas pela Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR) nas visitas que fez aos Censes do estado, a advogada Maria Christina dos Santos, da Comissão da Criança e do Adolescente da ordem, reforçou a necessidade da luta pela ressocialização das crianças e dos adolescentes em conflito com a lei. “A efetivação dos direitos da criança e do adolescente deve ser assegurada com absoluta prioridade, o que também compreende a destinação prioritária de recursos. Se não há recursos para quem é prioridade absoluta, há recursos para quê?”, questionou firmemente a advogada.

Por fim, a assistente social representante do Conselho Regional de Serviço Social do Paraná (CRESS-PR) e do movimento Paraná Contra a Redução da Maioridade Penal, Fernanda Camargo, disse que a perspectiva do movimento é trazer, para o debate, as condições do adolescente brasileiro, além de conversar com a sociedade de maneira ampliada. Na audiência, Fernanda chamou a atenção para a falta de planejamento e recursos para o sistema socioeducativo do Paraná. “Quando falamos Políticas Públicas, entendemos que não depende da boa vontade das pessoas. Depende de estar na agenda política, na agenda de debates, e isso significa ter orçamento destinado da maneira como deve ter para a proteção social desse adolescente”, cobrou Fernanda.

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Foto: Pedro de Oliveira/ Alep

A realidade das famílias e dos adolescentes que se encontram, hoje, no sistema de socioeducação também foi abordada por Fernanda. “Há alguns dados no Plano Estadual de Atendimento Socioeducativo que mostram quem são esses adolescentes e quem são essas famílias, e elas são um reflexo da criminalização da pobreza. Isso também deve ser debatido”, finalizou. Como encaminhamento da audiência pública, Fernanda propôs a ampliação da participação da sociedade no planejamento e na gestão do Sinase, com amplo envolvimento das trabalhadoras e dos trabalhadores dessa área e da sociedade civil como um todo.

 

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